Entrevista: Mário Moutinho
O ator Mário Moutinho recorda a sua carreira e a série «Os Andrades» e fala dos seus atuais e próximos projetos. Hoje é o protagonista desta entrevista no SobreTudo.
1. Quem é o Mário Moutinho?
Sou um ator e produtor cultural. E também programador, principalmente quando dirigi artisticamente o FITEI. Passei pela rádio, nos meus tempos de juventude, onde, entre muitas outras coisas, fiz radio-teatro. A minha mãe dizia que eu era um saltimbanco, porque andava sempre daqui para ali com as minhas atividades. Gosto de boas cavaqueiras e de contar histórias. Nasci no Porto, onde fiz praticamente toda a minha carreira e procuro ser um cidadão activo e interventivo.
2. Como nasceu a sua paixão pela representação?
Não sei muito bem. Comecei a ir ao teatro, com o meu pai, ainda muito novo, com 11 ou 12 anos, mas o meu principal interesse era o cinema, queria ser realizador. As minhas primeiras experiências no teatro não foram nada entusiasmantes e durante uns anos não voltei ao palco como ator. Mais tarde fui para França fazer uma formação em realização cinematográfica e aí entusiasmei-me pela área de direção de atores. Depois, já no final dos anos 70 do século passado, acabo por integrar um certo “movimento” que surgiu com a formação de diversas companhias semi-profissionais na cidade do Porto, companhias que procuravam uma forma diferente de construir os seus espetáculos e que privilegiavam as ações de formação. É aí que eu começo a minha carreira de ator, o que não estava nos meus objetivos iniciais, como disse. Essencialmente no TAI, companhia de que fui o principal animador durante cerca de dez anos.
3. A sua carreira teatral passou-se maioritariamente na Seiva Trupe, no Porto. Fale-nos sobre esta companhia teatral.
Como ator, sim, foi de facto na Seiva Trupe que desenvolvi grande parte do meu trabalho como ator, embora como criador de vídeos de cena, encenador, assistente de encenação, autor e ator tenha colaborado com quase todas as companhias que existiam no Porto nos anos oitenta e noventa. A Seiva Trupe é uma companhia de referência na cidade, mas está neste momento a viver um período muito difícil, por variadíssimos motivos, como o corte significativo nas verbas oficiais de apoio e a expulsão do Teatro do Campo Alegre pelo anterior executivo camarário. A Seiva e o Teatro Experimental do Porto eram as únicas companhias profissionais da cidade do Porto na altura do 25 de Abril, sendo que a Seiva estava praticamente a nascer nessa altura. Criou e fidelizou um público muito próprio, produzindo espectáculos que estavam em cena dois, três meses, por vezes mais. Apresentou textos que tinham sido censurados, alguns clássicos e autores contemporâneos. Alguns grandes êxitos da comédia portuguesa foram também êxitos da companhia, que muitas vezes manteve duas salas a trabalhar em simultâneo, com duas peças diferentes e dois elencos. Na Seiva Trupe tive a possibilidade de trabalhar com grandes encenadores, como Carlos Avilez, de quem fui assistente, Alberto Bokos, Júlio Castronuovo, Roberto Lage, Roberto Merino e muitos outros.
4. O Mário ficou conhecido do grande público como a voz de algumas personagens das séries infantis «A Árvore dos Patafúrdios», «Os Amigos do Gaspar» e «Mópi». Que recordações guarda destes projetos?
Voz e manipulação. Nessas séries fiz, de facto, personagens que ficaram na memória das pessoas o que me deixa, claro, muito feliz. As recordações principais que guardo dessas séries, para além dos personagens que criei, como é natural, têm a ver com todo o processo criativo e o trabalho desenvolvido por toda a fantástica equipa de criadores que o João Paulo Seara Cardoso reuniu. A «Árvore dos Patafúrdios», com textos do Sérgio Godinho, foi a nossa aprendizagem. Para todos: autores, actores-manipuladores, realização, produção, técnica, tudo… Mas o resultado foi interessante. Era a história de um grupo de passarocos estranhos que viviam numa árvore muito especial. Eu criei o Vinte-e-quatro, um personagem que apesar deste seu nome matemático era um poeta e só falava em verso. E também fazia um dos Bichos-da-Fruta. Já «Os Amigos do Gaspar», de que fizemos três séries, tinha textos do Jorge Constante Pereira e do próprio João Paulo Seara Cardoso, mas as letras das músicas continuaram a ser do Sérgio Godinho. A criação desta série foi muito divertida, com encontros intermináveis noite dentro com os autores, os cenógrafos e autores das marionetas que eram o Alberto Péssimo e o Rui Anahory e ainda alguns dos atores-manipuladores. Era nessas reuniões que se definiam os personagens e se esboçavam as histórias. Para estas três séries dos “gaspares” eu criei três personagens: o Professor, uma espécie de cientista distraído, o Neca, um ajudante de merceeiro que gostava mais de jogar à bola, e o Guarda Serôdio, uma autoridade bacoca que tentava pôr ordem no jardim e nas crianças e que constituiu, juntamente com o Manjerico, uma das referências da série. A outra série que referes, o «Mópi» não teve o mesmo êxito das anteriores – foram menos episódios, creio que seis ou sete, e transmitidos pela manhã, bastante cedo. Foi uma série de transição, quando já estávamos a preparar aquela que seria a última deste género: «No tempo dos Afonsinhos». O «Mópi» era um cão que conversava com seus vizinhos e directamente com os telespectadores-crianças e cantava magníficas músicas originais do João Loio. Eu fazia o único personagem real que dialogava com os bonecos: um carteiro refilão.
5. Em 1993, é protagonista da série «Os Andrades», da RTP. Como justifica o sucesso da série e da personagem, mais de vinte anos depois?
É de facto um sucesso, mesmo ao fim destes anos todos. Ainda hoje me abordam na rua para falar do Andrade e da sua sogra. Não sei como se justifica, mas parece-me que há coisas que decididamente contribuíram para isso: a realidade familiar e os seus conflitos (genro/sogra, mas também homens/mulheres, crianças/adultos, casal/outros, ingenuidade/esperteza saloia, etc.); família claramente portuense, mas com um elemento de fora (a sogra); situações reconhecidas como possíveis (os próprios autores diziam que muitas das ideias lhes tinham surgido depois de terem conhecimento de notícias que recebiam no jornal onde trabalhavam). Estas poderão ser algumas das razões do sucesso. Mas para além de tudo isto, tratou-se de uma série escrita por dois grandes autores: o Manuel António Pina e o Álvaro Magalhães. De certa forma, «Os Andrades» fazem já parte do património da cidade. O escritor Hélder Pacheco que tem publicados diversos livros sobre o Porto e a sua história, vai publicar no seu próximo livro um capítulo sobre a série.
6. Faria uma nova temporada de «Os Andrades»? Como seria a família Andrade no século XXI?
Talvez. Tudo depende de vários factores. Há pouco tempo fui com a Emília Silvestre, que na série fazia a vizinha, ao programa da manhã da RTP [«A Praça»] e perguntaram-nos precisamente isso: se estaríamos dispostos a fazer uma nova série. Não é uma resposta que se possa dar de um momento para o outro. É preciso saber que adaptação se fará ao tempo presente e, principalmente, quem a faz. Até porque há realidades incontornáveis, como o facto de ter falecido o Manuel António Pina, um dos autores. Também a Maria Dulce (a sogra) já não está entre nós. Por sua vez, os filhos poderão não estar presentes, uma vez que o Manuel Cardoso (o Zézé) não me parece que esteja disponível e o mesmo poderá acontecer com a Andrea Oliveira (a Lila). Numa nova série poderiam estar emigrados, como muitos dos nossos jovens. O que fica como base de uma nova série? Substituem-se alguns actores? Cria-se uma estrutura com base avós/netos. Pode ser interessante. Com a inabilidade dos mais velhos para as novas tecnologias, por exemplo. Mas se o Álvaro Magalhães estiver disposto a abraçar o novo projecto, aí sim, estaria disposto a repensar a participação numa nova série.
7. Numa entrevista, o Mário disse que «A RTP Porto perdeu uma oportunidade histórica de ser o grande centro de produção nacional». Porquê?
Já não me lembro dessa entrevista, mas de facto penso isso. Repara, entre meados dos anos oitenta e meados dos anos noventa, a RTP Porto produziu um conjunto de séries para a infância, como aquelas de que falamos mais atrás, e depois para adultos, como o «Clube Paraíso» e «Os Andrades». Isso permitiu a formação de quadros na empresa especializados em ficção – operadores de câmara, assistentes, cenógrafos, aderecistas, produtores, etc. E também de atores. O Paulo Grisolli veio do Brasil dirigir atores para representação em televisão. Foi uma aprendizagem de uma década que foi deitada ao lixo. Mais: começavam nessa altura a sair os primeiros profissionais das escolas de teatro do Porto, excelentes atrizes, atores e técnicos que poderiam renovar os elencos artísticos e reforçar as equipas técnicas. Não os aproveitaram e muitos deles foram trabalhar para Lisboa.
8. Como avalia o estado atual do panorama televisivo português?
A RTP2 é um canal de excelência. O melhor canal da televisão portuguesa, principalmente pela programação de séries europeias, filmes e documentários. Nos restantes canais há mais ficção portuguesa, mas nem toda é boa, nota-se que há demasiada pressa e pouco orçamento. E tenho muitas dúvidas sobre os serviços noticiosos.
9. A sua carreira também passou pelo cinema, como por exemplo, o filme «Jaime». Como foi participar num dos filmes portugueses mais vistos de sempre?
Apesar de ser um papel relativamente pequeno, foi uma excelente experiência e gostei imenso de trabalhar com o António Pedro Vasconcelos. E também com a Fernanda Serrano com quem, a pedido do realizador, fiz uma leve aproximação à pronúncia do norte. O convite para participar no filme surgiu praticamente sem contar. Na altura tinha organizado diversos castings no Porto para cinema, nomeadamente para o «Vale Abraão», do Manoel de Oliveira, e a produção entrou em contacto comigo para sugerir actores do Porto para algumas das cenas que seriam filmadas aqui. O casting foi feito para atrizes e atores não da minha idade, por isso o convite foi uma surpresa. Depois estive quase para não fazer o papel, dado que o início da rodagem atrasou-se alguns meses e o jovem que fazia de meu filho cresceu imenso, o que levou o realizador e a produção a pensar em arranjar um actor mais alto. Mas acabei por ser eu a fazer o papel.
10. Quais são os seus atuais e próximos projetos?
Estou com diversos projectos. Aquele em que estou envolvido neste momento é o espetáculo «Pequeno trabalho para velho palhaço» de Matéi Visniec que vai entrar em digressão depois da sua apresentação na Casa das Artes do Porto. Em abril vou trabalhar com a encenadora Luísa Pinto e a partir de outubro regresso ao Teatro de Marionetas do Porto como ator para um trabalho encenado pelo Roberto Merino. E em paralelo com tudo isto, tenho de acabar o livro sobre o teatro no Porto entre o 25 de abril e o aparecimento das companhias profissionais independentes.
Sou um ator e produtor cultural. E também programador, principalmente quando dirigi artisticamente o FITEI. Passei pela rádio, nos meus tempos de juventude, onde, entre muitas outras coisas, fiz radio-teatro. A minha mãe dizia que eu era um saltimbanco, porque andava sempre daqui para ali com as minhas atividades. Gosto de boas cavaqueiras e de contar histórias. Nasci no Porto, onde fiz praticamente toda a minha carreira e procuro ser um cidadão activo e interventivo.
2. Como nasceu a sua paixão pela representação?
Não sei muito bem. Comecei a ir ao teatro, com o meu pai, ainda muito novo, com 11 ou 12 anos, mas o meu principal interesse era o cinema, queria ser realizador. As minhas primeiras experiências no teatro não foram nada entusiasmantes e durante uns anos não voltei ao palco como ator. Mais tarde fui para França fazer uma formação em realização cinematográfica e aí entusiasmei-me pela área de direção de atores. Depois, já no final dos anos 70 do século passado, acabo por integrar um certo “movimento” que surgiu com a formação de diversas companhias semi-profissionais na cidade do Porto, companhias que procuravam uma forma diferente de construir os seus espetáculos e que privilegiavam as ações de formação. É aí que eu começo a minha carreira de ator, o que não estava nos meus objetivos iniciais, como disse. Essencialmente no TAI, companhia de que fui o principal animador durante cerca de dez anos.
3. A sua carreira teatral passou-se maioritariamente na Seiva Trupe, no Porto. Fale-nos sobre esta companhia teatral.
Como ator, sim, foi de facto na Seiva Trupe que desenvolvi grande parte do meu trabalho como ator, embora como criador de vídeos de cena, encenador, assistente de encenação, autor e ator tenha colaborado com quase todas as companhias que existiam no Porto nos anos oitenta e noventa. A Seiva Trupe é uma companhia de referência na cidade, mas está neste momento a viver um período muito difícil, por variadíssimos motivos, como o corte significativo nas verbas oficiais de apoio e a expulsão do Teatro do Campo Alegre pelo anterior executivo camarário. A Seiva e o Teatro Experimental do Porto eram as únicas companhias profissionais da cidade do Porto na altura do 25 de Abril, sendo que a Seiva estava praticamente a nascer nessa altura. Criou e fidelizou um público muito próprio, produzindo espectáculos que estavam em cena dois, três meses, por vezes mais. Apresentou textos que tinham sido censurados, alguns clássicos e autores contemporâneos. Alguns grandes êxitos da comédia portuguesa foram também êxitos da companhia, que muitas vezes manteve duas salas a trabalhar em simultâneo, com duas peças diferentes e dois elencos. Na Seiva Trupe tive a possibilidade de trabalhar com grandes encenadores, como Carlos Avilez, de quem fui assistente, Alberto Bokos, Júlio Castronuovo, Roberto Lage, Roberto Merino e muitos outros.
4. O Mário ficou conhecido do grande público como a voz de algumas personagens das séries infantis «A Árvore dos Patafúrdios», «Os Amigos do Gaspar» e «Mópi». Que recordações guarda destes projetos?
Voz e manipulação. Nessas séries fiz, de facto, personagens que ficaram na memória das pessoas o que me deixa, claro, muito feliz. As recordações principais que guardo dessas séries, para além dos personagens que criei, como é natural, têm a ver com todo o processo criativo e o trabalho desenvolvido por toda a fantástica equipa de criadores que o João Paulo Seara Cardoso reuniu. A «Árvore dos Patafúrdios», com textos do Sérgio Godinho, foi a nossa aprendizagem. Para todos: autores, actores-manipuladores, realização, produção, técnica, tudo… Mas o resultado foi interessante. Era a história de um grupo de passarocos estranhos que viviam numa árvore muito especial. Eu criei o Vinte-e-quatro, um personagem que apesar deste seu nome matemático era um poeta e só falava em verso. E também fazia um dos Bichos-da-Fruta. Já «Os Amigos do Gaspar», de que fizemos três séries, tinha textos do Jorge Constante Pereira e do próprio João Paulo Seara Cardoso, mas as letras das músicas continuaram a ser do Sérgio Godinho. A criação desta série foi muito divertida, com encontros intermináveis noite dentro com os autores, os cenógrafos e autores das marionetas que eram o Alberto Péssimo e o Rui Anahory e ainda alguns dos atores-manipuladores. Era nessas reuniões que se definiam os personagens e se esboçavam as histórias. Para estas três séries dos “gaspares” eu criei três personagens: o Professor, uma espécie de cientista distraído, o Neca, um ajudante de merceeiro que gostava mais de jogar à bola, e o Guarda Serôdio, uma autoridade bacoca que tentava pôr ordem no jardim e nas crianças e que constituiu, juntamente com o Manjerico, uma das referências da série. A outra série que referes, o «Mópi» não teve o mesmo êxito das anteriores – foram menos episódios, creio que seis ou sete, e transmitidos pela manhã, bastante cedo. Foi uma série de transição, quando já estávamos a preparar aquela que seria a última deste género: «No tempo dos Afonsinhos». O «Mópi» era um cão que conversava com seus vizinhos e directamente com os telespectadores-crianças e cantava magníficas músicas originais do João Loio. Eu fazia o único personagem real que dialogava com os bonecos: um carteiro refilão.
5. Em 1993, é protagonista da série «Os Andrades», da RTP. Como justifica o sucesso da série e da personagem, mais de vinte anos depois?
É de facto um sucesso, mesmo ao fim destes anos todos. Ainda hoje me abordam na rua para falar do Andrade e da sua sogra. Não sei como se justifica, mas parece-me que há coisas que decididamente contribuíram para isso: a realidade familiar e os seus conflitos (genro/sogra, mas também homens/mulheres, crianças/adultos, casal/outros, ingenuidade/esperteza saloia, etc.); família claramente portuense, mas com um elemento de fora (a sogra); situações reconhecidas como possíveis (os próprios autores diziam que muitas das ideias lhes tinham surgido depois de terem conhecimento de notícias que recebiam no jornal onde trabalhavam). Estas poderão ser algumas das razões do sucesso. Mas para além de tudo isto, tratou-se de uma série escrita por dois grandes autores: o Manuel António Pina e o Álvaro Magalhães. De certa forma, «Os Andrades» fazem já parte do património da cidade. O escritor Hélder Pacheco que tem publicados diversos livros sobre o Porto e a sua história, vai publicar no seu próximo livro um capítulo sobre a série.
6. Faria uma nova temporada de «Os Andrades»? Como seria a família Andrade no século XXI?
Talvez. Tudo depende de vários factores. Há pouco tempo fui com a Emília Silvestre, que na série fazia a vizinha, ao programa da manhã da RTP [«A Praça»] e perguntaram-nos precisamente isso: se estaríamos dispostos a fazer uma nova série. Não é uma resposta que se possa dar de um momento para o outro. É preciso saber que adaptação se fará ao tempo presente e, principalmente, quem a faz. Até porque há realidades incontornáveis, como o facto de ter falecido o Manuel António Pina, um dos autores. Também a Maria Dulce (a sogra) já não está entre nós. Por sua vez, os filhos poderão não estar presentes, uma vez que o Manuel Cardoso (o Zézé) não me parece que esteja disponível e o mesmo poderá acontecer com a Andrea Oliveira (a Lila). Numa nova série poderiam estar emigrados, como muitos dos nossos jovens. O que fica como base de uma nova série? Substituem-se alguns actores? Cria-se uma estrutura com base avós/netos. Pode ser interessante. Com a inabilidade dos mais velhos para as novas tecnologias, por exemplo. Mas se o Álvaro Magalhães estiver disposto a abraçar o novo projecto, aí sim, estaria disposto a repensar a participação numa nova série.
7. Numa entrevista, o Mário disse que «A RTP Porto perdeu uma oportunidade histórica de ser o grande centro de produção nacional». Porquê?
Já não me lembro dessa entrevista, mas de facto penso isso. Repara, entre meados dos anos oitenta e meados dos anos noventa, a RTP Porto produziu um conjunto de séries para a infância, como aquelas de que falamos mais atrás, e depois para adultos, como o «Clube Paraíso» e «Os Andrades». Isso permitiu a formação de quadros na empresa especializados em ficção – operadores de câmara, assistentes, cenógrafos, aderecistas, produtores, etc. E também de atores. O Paulo Grisolli veio do Brasil dirigir atores para representação em televisão. Foi uma aprendizagem de uma década que foi deitada ao lixo. Mais: começavam nessa altura a sair os primeiros profissionais das escolas de teatro do Porto, excelentes atrizes, atores e técnicos que poderiam renovar os elencos artísticos e reforçar as equipas técnicas. Não os aproveitaram e muitos deles foram trabalhar para Lisboa.
8. Como avalia o estado atual do panorama televisivo português?
A RTP2 é um canal de excelência. O melhor canal da televisão portuguesa, principalmente pela programação de séries europeias, filmes e documentários. Nos restantes canais há mais ficção portuguesa, mas nem toda é boa, nota-se que há demasiada pressa e pouco orçamento. E tenho muitas dúvidas sobre os serviços noticiosos.
9. A sua carreira também passou pelo cinema, como por exemplo, o filme «Jaime». Como foi participar num dos filmes portugueses mais vistos de sempre?
Apesar de ser um papel relativamente pequeno, foi uma excelente experiência e gostei imenso de trabalhar com o António Pedro Vasconcelos. E também com a Fernanda Serrano com quem, a pedido do realizador, fiz uma leve aproximação à pronúncia do norte. O convite para participar no filme surgiu praticamente sem contar. Na altura tinha organizado diversos castings no Porto para cinema, nomeadamente para o «Vale Abraão», do Manoel de Oliveira, e a produção entrou em contacto comigo para sugerir actores do Porto para algumas das cenas que seriam filmadas aqui. O casting foi feito para atrizes e atores não da minha idade, por isso o convite foi uma surpresa. Depois estive quase para não fazer o papel, dado que o início da rodagem atrasou-se alguns meses e o jovem que fazia de meu filho cresceu imenso, o que levou o realizador e a produção a pensar em arranjar um actor mais alto. Mas acabei por ser eu a fazer o papel.
10. Quais são os seus atuais e próximos projetos?
Estou com diversos projectos. Aquele em que estou envolvido neste momento é o espetáculo «Pequeno trabalho para velho palhaço» de Matéi Visniec que vai entrar em digressão depois da sua apresentação na Casa das Artes do Porto. Em abril vou trabalhar com a encenadora Luísa Pinto e a partir de outubro regresso ao Teatro de Marionetas do Porto como ator para um trabalho encenado pelo Roberto Merino. E em paralelo com tudo isto, tenho de acabar o livro sobre o teatro no Porto entre o 25 de abril e o aparecimento das companhias profissionais independentes.
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